Crítica: Planeta dos Macacos: O confronto

“Nooooooo”. A cena em que Caesar (Andy Serkis) profere suas primeiras palavras em “Planeta dos Macacos: A Origem” ainda me fascina. Também me fascina a maneira que os produtores e roteiristas encontraram para unir a história atual ao estado em que encontramos as coisas no primeiro “Planeta dos Macacos”, de 1968. No clássico protagonizado por Charlton Heston, somos apresentados a um planeta Terra habitado por símios falantes, desenvolvidos e convivendo em sociedade – sociedade esta com classes militares, científicas e sacerdotais cujo grande “deus” era Caesar, um tipo de “macaco-Jesus” daquele mundo. Havia seres humanos naquela sociedade? Sim, mas eram poucos, não falavam e eram dominados pelos macacos.

Quando descobrimos que, na verdade, tudo começou com um desastroso experimento genético em chimpanzés, tudo fez mais sentido: os experimentos criaram macacos mais desenvolvidos intelectualmente e ao mesmo tempo deflagraram um vírus que assolou a raça humana.

É a partir deste cenário que embarcamos em uma viagem estonteante em “Planeta dos Macacos: O Confronto”. O mundo, em 10 anos, se esfacelou por conta da “gripe símia”. Poucos humanos, imunes ao vírus (em uma taxa de 1 pra 500) sobreviveram e tentam reerguer a sociedade sob duras penas. Governos não existem mais, as cidades estão desertas: tudo no melhor gênero “Walkind Dead” ou (para quem gosta de vídeo game) “The Last of Us”.

Do lado de lá da Golden Gate, o maior clima de #somostodosmacacos:  Caesar está com sua liderança consolidada e agora é pai de família, os macacos jovens estão estudando e aprendendo novas palavras com orangotango Maurice (Karin Konoval),  um amargurado Koba (Toby Kebbell) cheio de cicatrizes de laboratório e chiliques pontuais e os primeiros sinais de um “misticismo” símio que deve ser mais explorado no próximo filme.

Do lado de cá da ponte, #somostodoshumanosDreyfus (Gary Oldman, pouco explorado) faz o líder da comunidade de sobreviventes de São Francisco, o cara que tem que controlar o ímpeto e o medo do seu povo e lidar com a crescente escassez de recursos. O núcleo dos “cientistas-trabalhadores” é formado por Malcolm (Jason Clark, o cara do bem), Carver (Kirk Acevedo, o Toye de Band of Brothers – outro chiliquento), Alexander (Kodi Smit-McPhee, um adolescente do bem) e Ellie (Keri Russel, a cientista paz e amor ). A trupe funciona muito bem. Cada um ali reage de maneira diferente àquele mundo sombrio pós gripe símia e o filme não se furta em mostrar o histórico de cada um deles –  na dose exata –  ou seja, sem ser excessiva e desnecessariamente didático. As atuações estão sob-medida (o que é um alívio).

Na história, tudo vai muito bem até que macacos e humanos se encontram novamente. Aí, o que era bom até então, vira um quiprocó da p**** e a coisa desanda de vez.

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“Maldito o homem que confia no homem”

Na gênese das guerras e conflitos, sejam grandes ou pequenos, o estopim quase sempre é moldado em detalhes embrionários.  Isso vale tanto para as Guerras Mundiais quanto para as brigas que você tem com a sua esposa.

No “confronto” do título não é diferente: a natureza humana (e, nesse caso, a natureza inteligente dos macacos) jamais se apresenta – como na vida real – linear. O que é bom pra um, é ruim para o outro. O que é visto com amor por um é motivo de ódio para o outro. Coisas fora de lugar aqui, pisadas no pé ali e tudo vai se acumulando para que uma bola de neve se forme e, montanha abaixo, se torne gigante e incontrolável.

Felizmente, o diretor Matt Reeves soube conduzir tais elementos com bastante maestria. Somos apresentados a personagens cheios de traumas, dores e motivações diferentes entre si – sejam estes macacos ou humanos. Como cada um tem uma história, é impossível esperar que haja harmonia entre as duas sociedades e mesmo dentro de cada uma delas. Humanos podem ser boas criaturas, os macacos do filme também; humanos podem ser maus, os macacos também. Nessa misturança toda, é impossível esperar algo menos do que uma grande tragédia. E é esta tragédia, que começa dentro de cada uma das comunidades, que dá o subtítulo de “confronto” ao filme.

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Tudo funciona muito bem

Se a história é contada com excelência, o mesmo pode se dizer dos aspectos técnicos do filme. Os efeitos especiais seguem o mesmo grau de competência do filme anterior: as expressões faciais e trejeitos de cada macaco nos fazem esquecer de que estamos vendo apenas animações computadorizadas.

Confesso que em uma cena onde os olhos do protagonista são focalizados, tive dúvidas se aquilo era realmente uma animação. A trilha sonora também me chamou bastante atenção: ela mistura a grandeza orquestral comum em grandes filmes com momentos “experimento-sessentistas” da trilha do clássico de 68. Veja algumas cenas do original e preste atenção à trilha sonora. Depois, no cinema, compare com o novo. Vai ser uma experiência bastante interessante, te garanto. E o 3d? Vejam só, temos um filme que foi pensado para a tecnologia e ela  – aqui – funciona muito bem, não incomoda e em nenhum momento é cansativa. Diferente da maioria dos filmes atuais, o 3D agrega ao filme e vale mesmo pra quem (me incluo) torce o nariz para a tecnologia.

Pra quem gosta de cenas grandiosas de ação, temos um prato cheio em forma de um final apoteótico, um clímax de torcer os pulmões. Isso depois de testemunharmos as idas e vindas, o pior e o melhor da natureza de cada um daqueles personagens.

Defeitos?

Muito poucos, se é que existem. Planeta dos Macacos: O Confronto é um grande exemplo de como tecnologia e ficção podem parir um grande exemplar da sétima arte. Em suma, o novo Planeta dos Macacos é isso: um “baita” dum filme bom. Aliás, ele só tem um “defeito”. Como em todo filme de “meio de trilogia”, os créditos sobem e nos deixam com aquela sensação de “quero mais”. Nesse caso, ela se materializa em uma certeza: o pior ainda está por vir. E está mesmo.

Como os macacos finalmente irão subjulgar a raça humana? Como será o processo de organização da sociedade símia – militar, científica e religiosamente falando? Será que eles vão recrutar mais macacos de outras “comunidades”?

As repostas a algumas dessas perguntas devem vir no próximo filme. Por ora, nos basta o deleite desta excelente segunda parte. Mas que o terceiro não tarde, pois estou ansioso desde já.

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